Natalia Philadelpho Azevedo
Médica Veterinária Especializada em animais silvestres
Doutora pela USP
Os psitacídeos, aves que possuem o bico curvo e forte – tais como papagaios, calopsitas e araras -, são criaturas maravilhosas e formam laços muito fortes com seus donos, demostrando tal afeição de diversas formas. Seja brincando com seus cabelos (na natureza, limpam as penas dos parceiros), bicando delicadamente suas orelhas, “dividindo” sua comida ao regurgitarem (na natureza, uma forma de demonstrar amor entre companheiros), ou atacando aqueles que se aproximam demais de seus donos, essas aves podem externar sua afeição constantemente. Entender o comportamento da ave é fundamental, tanto para o tutor quanto para o médico veterinário.
Muitas vezes, o tutor não consegue entender o que a ave esta sentindo ou demonstrando, ou seja não consegue identificar quando ela esta com dor, frio, de mau humor ou feliz, e isso atrapalha muito o nosso trabalho. Ao conhecer o comportamento da sua ave, fica mais fácil identificar quando ela esta doente, já que esses animais não demonstram doença de forma tão clara como os cães (lembre-se, na natureza, um papagaio doente é presa fácil!), logo, caso necessário, a ida ao veterinário ocorrerá mais rapidamente, o que aumenta significativamente a chance de cura da ave. O principal responsável por ensinar isso ao tutor ainda é o médico veterinário, naquela primeira consulta, em que ensinamos, alimentação, cuidados básicos e prevenção de doenças.
Outro fator importante, é como a nossa atitude, e a do tutor podem reforçar alguns comportamentos. Vou dar um exemplo:
Ao palestrar sobre a conservação de aves em uma determinada escola, um treinador de aves trouxe consigo uma cacatua e a colocou em um poleiro enquanto falava com a plateia. A cacatua ficou lá por alguns minutos e depois começou a pedir atenção a seu dono, que continuou a palestra, ignorando a ave.
Não conseguindo a atenção desejada de seu treinador, a cacatua, então, resolveu voar até o chão. Imediatamente, o palestrante parou a palestra e a pegou no colo, enchendo-a de beijos antes de colocá-la novamente no poleiro, pedindo à ave que permanecesse lá. Após alguns minutos, a cacatua repetiu o processo de voar até o chão, e o palestrante repetiu sua ação de pegá-la e acariciá-la, cena que se repetiu até o final da palestra.
Em síntese, a ave, que apenas queria atenção, só conseguiu agindo contrariamente ao pedido de seu treinador, pois ao obedecer às ordens era prontamente ignorada. Desta forma, o treinador ao pegar, acariciar e beijar a cacatua toda vez que ela pousava no chão (contrariando, assim, sua ordem), acabou reforçando o comportamento indesejável.
E o que isso tem a ver com o médico veterinário? Muito! Por exemplo, um papagaio forma um vínculo muito forte com seu tutor, e por isso, demanda muita atenção, que nem sempre pode ser oferecida o tempo todo. Às vezes, por tédio, o papagaio acaba fazendo muito grooming, que pode levar ao arrancamento de suas próprias penas. Ao “brigar” com a ave ou dar atenção a ela, o tutor pode reforçar o comportamento no animal, que recebe atenção toda vez que se automutila. Se isso não for diagnosticado pelo veterinário, o tratamento nunca será eficaz!
O estudo do comportamento animal ajuda muito na clínica e também no tratamento. Se você achou esse artigo interessante e gostaria de saber mais, entre em contato com a gente!