João Fernando Brinkmann dos Santos
Na atualidade, tornou-se bastante plausível supor que novas formas de interações e intervenções profissionais surgirão atreladas ao emprego, cada vez maior, de associações com tecnologias e interfaces baseadas em inteligência artificial. Tal perspectiva já conta com larga utilização de algoritmos, criados por seres humanos, capazes de predições altamente acuradas – tecnologias que certamente evoluirão para a autonomia de softwares no sentido de viabilização de acréscimos de dados e protocolos sem a interferência humana, de tal forma que se consume de fato o que se espera de um mecanismo chamado de inteligente.
Considerando o panorama acima descrito, pode-se inferir que muitas atividades laborais, hoje desempenhadas por seres humanos, poderão ser atribuídas a mecanismos associados à inteligência artificial em um momento ao alcance, talvez, das gerações atuais e, com maior grau de certeza, das vindouras. Provavelmente, aqueles que estiverem dispostos e preparados a lidar com essa nova realidade, ainda (e sempre) encontrarão espaços, cada vez mais competitivos, para suas devidas inserções profissionais e remuneradas – contexto no qual nós, da Educação Física, também teremos que fomentar adaptações e repertórios criativos que venham a viabilizar a indispensabilidade de nossas participações nos processos laborais que, mesmo com toda a inteligência artificial que porventura venha a ser criada, ainda disponham de aptidões essenciais à prescrição de exercícios e, principalmente, à promoção de saúde.
Comumente, a prescrição de exercícios baseia-se (ou deveria basear-se) em modelagens matemáticas de sinais fisiológicos e bioquímicos – de maneira a possibilitar a quantificação objetiva do esforço realizado e, com isso, aumentar a confiabilidade da formação de juízo de valor a respeito do trabalho realizado. Tais modelagens, com relativa facilidade, podem ser atribuídas a “robôs” e, teoricamente, as prescrições poderiam ser elaboradas e emanadas a partir desses autômatos – que não necessariamente precisam contar com aspectos humanos (dedução ainda potencialmente esperada a partir do emprego do termo “robô”). Todavia, os contratantes de tais serviços, prescrição de exercícios, com toda certeza que se é possível ter sobre algum assunto, certamente serão humanos – de tal maneira que constituir-se-ão (como sempre foi e ainda é neste exato momento) em seres resultantes de características genotípicas (toda carga genética) e fenotípicas (tudo o que é acrescido ao indivíduo desde que ele nasce – como influencias ambientais e comportamentais), além de todo o contexto geográfico, psicológico e social inerentes ao meio com o qual interagem desde que passam a utilizar seus pulmões como meio de troca de gases entre a atmosfera circundante aos seus corpos e seus tecidos propriamente ditos.
Sendo os humanos, portanto, seres geo-bio-psico-sociais, constituídos e influenciados, até mesmo regidos e/ou sincronizados por e com múltiplos mecanismos naturais e fabricados pela humanidade, pode-se imaginar que ainda existam, mesmo num futuro próximo dotado de toda a tecnologia que se possa imaginar/conceber, características como a consciência crítica, flexibilidade e adaptabilidade frente ao imponderável, busca por felicidade e, acima de tudo, conceitos que remetam à possibilidade de esperança crescente em torno da procura por constante burilamento ético e moral – matizes que, por mais singelas que possam ser, sempre nos remeterão à condição de personas insubstituíveis e, quem sabe, essenciais a todos e quaisquer processos pertinentes ao nosso campo de atuação profissional.
Talvez não seja possível barrar a, aparentemente irrefreável, evolução tecnológica e potencial substituição, em breve, de humanos por máquinas; mas sempre poderemos contar com todas as complexidades geradoras de tantos bilhões e bilhões de individualidades e interesses em um contexto no qual nem mesmo os computadores quânticos (que contam com todos os números entre zero e um em sua engenharia funcional) poderão se adaptar à todas possíveis discrepâncias de interesses, personalidades e objetivos intrínsecos aos seres humanos – principalmente no que concerne a dúvidas, incertezas e hesitações, que sempre nos diferenciarão dos chamados robôs.
Ao menos, que não sejamos nós, da Educação Física, agentes passíveis de substituição pelos mecanismos de inteligência artificial; e que trilhemos caminhos pautados na esperança de que nossas identidades, hoje e sempre, sejam as de indivíduos providos de razão, sentimentos e capacidade de discernimento entre o certo e o errado, melhor e pior, possível e real – diferenciações obtidas por constructos mentais e sublimes, como nenhum hardware ou software jamais poderia fazer por si só.